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deuses as opiniões que deles tem a maior-
ia. Com efeito, as opiniões da maioria
sobre os deuses não são prolepses, mas
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opiniões enganosas. Os deuses, com
efeito, entregues continuamente às suas
virtudes, são queridos por todos os seus
semelhantes, mas rejeitam como estranho
tudo o que não é semelhante a eles
(EPICURO. Carta a Meneceu).
A leitura do texto esclarece. Sendo os
deuses perfeitos e imortais, é contraditório
que se preocupem com fluxos e imper-
manências. Mais ainda, que façam o mal
para alguém. Aquele que é perfeitamente
bom não causa dor ou tristeza. Nem como
punição.
Por isso, observa Epicuro, os homens
identificam-se com os deuses e neles pro-
jetam todo o seu ódio, vingança, ciúme e
maldade. Os que temem os deuses são
hereges, ímpios, que causam mal a si mes-
mos e aos demais. Porque o homem é causa
última de sua própria infelicidade.
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Desta forma, não há do que responsabiliz-
ar os deuses. Nem mesmo do medo que
temos de morrer. Não só porque, como in-
dica o texto, os deuses não têm nada com
isso. Porque não estão nem aí para a nossa
finitude. Mas também porque a morte não
deve nem pode ser temida. Temer a morte é
temer algo que não existe para o homem.
Impossibilitado de senti-la e conhecê-la. Ex-
periência que escapa à condição humana.
Como assim, a morte não existe para o
homem?
Provavelmente o leitor deve estar achando
que Epicuro e eu piramos. Porém, como diria
este filósofo e Freud mais tarde, o que passa
pela sua cabeça quando você pensa na
morte é somente uma projeção de sua con-
fusão mental. A loucura está em quem pensa
um dia poder experimentá-la. Explicaremos.
Na física epicurista, herdeira de Leucipo e
Demócrito, a realidade é constituída por
átomos e vazio. E isto é tudo. Esse vazio
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permite aos átomos movimentarem-se. E,
quando se movimentam, acabam se
esbarrando. Chocando-se. Todas as mani-
festações no mundo são redutíveis a esse
movimento dos átomos. É a partir desta
física que podemos entender uma ética de
Epicuro. Uma ética de oposição aos mitos.
Nesta perspectiva, o real todo ele
atômico só existe para nós a partir de in-
formações que nos proporcionam os cinco
sentidos. O mundo é o que vejo, o que ouço,
o que cheiro, o que sinto etc. É a experiência
que define o mundo para mim. E se tudo é
átomo em movimento, a percepção que
tenho do mundo também não passa disso.
Como assim? Quando uma árvore se en-
contra diante de mim, por que a vejo? Se os
átomos que a constituem estão lá e os que
me constituem aqui?
Querido leitor. Você entendeu tudo. No
pensamento de Epicuro, é preciso que, de al-
gum jeito, os átomos da árvore se choquem
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com os seus. Para que você a perceba. E essa
experiência só é possível graças aos simulac-
ros. São partículas atômicas, matéria fina,
que se despregam do corpo observado e se
chocam com os sentidos do observador.
Assim, se neste instante estou vendo o com-
putador é porque meus olhos estão sendo
bombardeados de fragmentos desse com-
putador. E se Cecília é cega é porque os
simulacros do mundo não lhe atingem. O
mesmo vale para qualquer outra coisa que
possa ver, bem como ouvir e cheirar.
Eu sei que parece maluquice. Mas, saiba
que, até o século XVII, acreditava-se nisso.
Imagine, caro leitor, uma mulher contem-
plando outra. A rivalidade aflora. Uma só vê
na outra seus excessos. Gordura em demasia.
Ora, de acordo com a teoria do simulacro de
Epicuro, se é gordura que vê é porque
partículas adiposas abandonam o corpo da
mulher observada em direção aos olhos da
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observadora. Ninguém poderá negar aqui
uma origem remota da lipoaspiração.
Galhofas à parte, nesta perspectiva
científica que é a de Epicuro, todo real é per-
cebido exclusivamente pelo próprio real.
Nunca de fora, ou de cima. Na mais estrita
imanência, para falar difícil. Assim, se há
deuses, também são átomos em movimento.
Estamos aqui bem longe das concepções de
alma eterna e imaterial e de verdades ab-
solutas do primeiro capítulo.
Se todo o conhecimento e sensação
provêm dos sentidos então o mundo em que
vivemos é o mundo que sentimos. Poder-
íamos perguntar: posso ter a sensação de es-
tar no Polo Norte estando em Salvador da
Bahia, em banca de doutorado na Universid-
ade Federal? A menos que seja um psicótico
bem avançado a resposta é não. É preciso
que o corpo sinta para que uma experiência
possa existir. Até aqui creio que o leitor de
bom-senso concorde com Epicuro.
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Mas, de que corpo é esse de que tanto
você fala?
O corpo, na perspectiva de Epicuro, é con-
stituído de matéria, agenciada ou organizada
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